A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou o uso da vacina Coronavac contra a Covid-19 em crianças de 3 a 5 anos de idade no Brasil. Os diretores da Anvisa votaram pela ampliação do uso da Coronavac em reunião pública realizada nesta quarta-feira (13).
Votaram favoravelmente os diretores Meiruze Sousa Freitas, Rômison Rodrigues Mota, Alex Machado Campos e Cristiane Rose Jourdan, o que garante a aprovação por maioria. O diretor-presidente Antonio Barra Torres realiza o seu voto neste momento. A decisão ocorre após avaliação técnica do pedido do Instituto Butantan, submetido no dia 11 de março.
Durante o processo, a Anvisa realizou exigências de dados e informações adicionais aos pesquisadores do Butantan. Além disso, buscou informações disponíveis sobre o uso da vacina em crianças no Chile e em estudos de efetividade realizados no Brasil com a população infantil e adolescentes vacinadas.
A Coronavac está autorizada para uso emergencial na população adulta no Brasil desde o dia 17 de janeiro de 2021. No dia 20 de janeiro, a agência autorizou o uso da vacina em crianças e adolescentes de 6 a 17 anos de idade.
No dia 8 de julho, a Anvisa recebeu o pedido do Butantan de registro definitivo da Coronavac. O prazo de análise é de 60 dias.
Destaques dos diretores
Em sua fala, a diretora Meiruze Sousa Freitas, relatora do processo, abordou pontos críticos favoráveis à aprovação da ampliação do uso da Coronavac, incluindo os impactos da infecção para a faixa etária abaixo de cinco anos.
“Essa vacina atende aos critérios necessários de qualidade e segurança para o uso em crianças. Ainda que a eficácia seja limitada, os dados indicam que o uso da Coronavac pode ajudar na prevenção de agravamento e óbitos por Covid-19, para o uso emergencial na população pediátrica de 3 a 5 anos”, disse Meiruze.
A diretora destacou que, até o momento, não há alternativa terapêutica específica para crianças aprovada e disponível no Brasil para prevenir ou tratar a doença.
“Uma vacina que seja capaz de reduzir os riscos da doença nas crianças de 3 a 5 anos, em especial quanto ao desenvolvimento das formas graves, pode contribuir para reduzir os danos e o controle da doença”, disse a diretora.
O diretor Rômison Rodrigues Mota destacou que a Covid-19 está entre as principais causas de morte na faixa etária. “Por mais que a população pediátrica não seja a mais suscetível ao agravamento da Covid-19, isso não significa dizer que está a salvo de desfechos graves ou até mesmo a morte”, disse.
Considerações da área técnica da Anvisa
O gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa Gustavo Mendes apresentou resultados dos estudos avaliados pela equipe técnica para a emissão da recomendação à diretoria da agência.
A equipe técnica da Anvisa concluiu que a totalidade das evidências científicas disponíveis sugerem que há indicativos de benefícios para a utilização da vacina na população pediátrica. Os especialistas recomendaram a ampliação da aplicação da Coronavac para crianças de 3 a 5 anos, exceto imunossuprimidos.
Deve ser utilizada a mesma dosagem do imunizante aplicado na população em geral, de 0,5 ml, com o mesmo esquema de duas doses com o intervalo de 28 dias. Para a recomendação, a equipe técnica considerou a ausência de tratamentos medicamentosos e vacinas aprovados para crianças nessa faixa etária.
A equipe recomendou, ainda, acordo com o Instituto Butantan para apresentação e avaliação criteriosa dos dados de estudos clínicos controlados que estão em andamento.
Na reunião, a gerente de Farmacovigilância da Anvisa Helaine Capucho abordou o cenário atual e o impacto das vacinas para crianças e adolescentes no Brasil.
Segundo Helaine, houve uma redução do número de óbitos por Covid-19 entre adolescentes de 12 a 17 anos, durante o período mais crítico da pandemia em 2022. Além de um aumento de óbitos em menores de 12 anos, principalmente nos menores de 5 anos.
O parecer da gerência de Farmacovigilância foi favorável à ampliação da faixa etária do uso da Coronavac.
O documento aponta que o perfil de eventos adversos em crianças e adolescentes é semelhante ao das demais faixas etárias. O documento indica que os eventos adversos graves observados após a administração de mais de 103 milhões de doses da Coronavac no Brasil são considerados raros ou raríssimos.
O que dizem os estudos
Antes da votação, a reunião contou com a participação de pesquisadores externos que apresentaram resultados de estudos sobre a Coronavac.
A pesquisadora Valéria Valim, professora de Medicina do Hospital Universitário Cassiano Antonio Moraes (Hucam) da Universidade Federal do Espírito Santo, destacou dados do Projeto Curumim, que investiga aspectos de eficácia, segurança e proteção da Coronavac em crianças e adolescentes.
“A Coronavac em crianças de 3 e 4 anos é segura e não inferior a crianças maiores de 5 anos. Crianças de 3 e 4 anos são capazes de induzir títulos maiores de anticorpos comparado com crianças maiores de cinco anos, adolescentes e adultos”, afirmou Valéria.
Os resultados do estudo Immunita, coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz Minas), foram apresentados pela pesquisadora Rafaella Fortini. O projeto, que avalia o uso da Coronavac em crianças acima de cinco anos, adolescentes, adultos e idosos, é realizado em Belo Horizonte e na cidade de Serrana, no interior de São Paulo, com a colaboração de diferentes centros de pesquisa.
A partir das amostras dos voluntários, os cientistas avaliam a capacidade de indução da resposta imunológica no organismo. Por meio de diferentes testes, são avaliadas a resposta de anticorpos totais, de anticorpos neutralizantes específicos e a resposta celular contra o coronavírus.
De acordo com a especialista, os dados do estudo revelam que a resposta imune (de anticorpos e celular) gerada pela Coronavac é mais expressiva em crianças e adolescentes do que em adultos e idosos, uma vez que apresentam maior índice de anticorpos totais e neutralizantes e maior liberação de mediadores celulares.
“As crianças desenvolvem uma resposta mais robusta que os adultos e os idosos”, afirmou Rafaella. “Crianças mais novas desenvolvem respostas mais robustas com elevados níveis de mediadores – que envolvem 27 mediadores, todos eles maiores em crianças de 6 a 9 anos”, completou.
O pesquisador Manoel Barral, da Fiocruz Bahia, apresentou dados do projeto Vigivac, programa que avalia a efetividade das vacinas contra a Covid-19 no Brasil.
De acordo com Barral, os resultados apresentam alta proteção contra casos graves, incluindo riscos de hospitalização e morte pela doença, em adolescentes. Os dados indicam proteção modesta contra formas leves e graves de Covid-19 em crianças, no período de alta circulação da variante Ômicron. O pesquisador destacou a capacidade de proteção da vacina e reforça a necessidade de avaliar a proteção em crianças com maior tempo de acompanhamento.
“Os dados atuais mostram que há uma vantagem na proteção também de crianças. Não há até o momento registros importantes de reações adversas em crianças. A gente está frente a uma proteção para a infecção de 40%, contra formas graves é maior do que isso, chega perto de 80% depois cai, então muitas crianças podem ser salvas com a aplicação das vacinas”, disse Barral.
O médico Marco Aurélio Sáfadi, professor de pediatria e infectologia e presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, recomendou a ampliação do uso da Coronavac para a faixa etária de 3 a 5 anos, na reunião da Anvisa.
Posicionamento de sociedades médicas
As sociedades brasileiras de Pediatria, de Imunizações, de Infectologia e de Pneumologia e Tisiologia emitiram parecer favorável à ampliação do uso da Coronavac.
“Os benefícios da vacinação na população de crianças de 3 a 5 anos, com a vacina Coronavac/Sinovac-Butantan (particularmente pela expectativa de redução do risco de hospitalizações), superam os eventuais riscos associados à vacinação, no contexto atual da pandemia”, dizem as entidades.
As instituições sugerem a realização de estudos para investigar a possibilidade de coadministração com outras vacinas pediátricas, o uso da vacina em esquemas alternativos, com doses de reforço e intervalos de doses superiores aos utilizados nos estudos.
“A duração da proteção com o esquema de doses e espaçamento das doses fixos sugere uma proteção superior a quatro meses, quando medida usando marcadores indiretos de imunogenicidade”, afirmou a Sociedade Brasileira de Imunologia.
A Associação Brasileira de Saúde Coletiva afirmou: “Com a demonstração repetida de que a proteção gerada pela vacina (independentemente do tipo de vacina) possui um tempo curto e a necessidade de possíveis doses adicionais, ajuda o fato da Coronavac possuir produção nacional e, portanto, maior disponibilidade em possíveis surtos futuros”.